IA e empatia: para além dos números, inovação tem a ver com pessoas

inovação e IA

Quando pensamos em inteligência artificial e automação, é quase impossível não lembrar da simpática Rosie, a robô dos Jetsons, que resolvia os problemas da família com muita eficiência. Por outro lado, cenários como os de 1984, obra de George Orwell, trazem uma visão bem mais sombria da tecnologia, marcada por monitoramento constante e privacidade zero. Embora sejam duas situações fictícias e extremas, elas não estão tão distantes do que vivemos hoje – especialmente no ambiente corporativo. Com a IA como ferramenta de gestão, tudo pode ser transformado em números e analisado rapidamente – inclusive as pessoas. Mas antes de dizer “não” aos algoritmos, vale a pena entender que, com empatia e ética, a IA pode impulsionar a gestão de pessoas em direção à inovação, sem invadir a privacidade alheia.

O desafio é claro: dados trazem maior assertividade às decisões, mas “dados demais” podem sinalizar um gerenciamento exagerado e até invasivo. Não à toa, encontrar o equilíbrio é fundamental para garantir que a tecnologia desempenhe seu papel na construção de ambientes mais engajadores e vibrantes. E aqui não estamos falamos apenas de otimizar processos. Ao adotar a IA, o RH não está apenas implementando uma nova ferramenta de gestão de pessoas, mas redefinindo como os dados podem servir ao capital humano e potencializar a inovação de forma muito mais estratégica.

Pé no chão

Por mais tentador que seja associar o uso da IA a distopias, especialistas como Felipe Corrêa, consultor em Gestão de Projetos e Inteligência Artificial, não acreditam que ela irá substituir as interações humanas, mas complementá-las. Segundo ele, o segredo está em equilibrar eficiência tecnológica e empatia. “Dados analisados por IA podem personalizar abordagens. Dessa forma, o RH não apenas promove uma cultura organizacional mais engajada e inovadora, mas também fortalece o sentimento de pertencimento e cuidado”, destaca.

IA e inovação
Felipe Corrêa – professor e consultor

Mais do que mapear tendências, identificar necessidades e agir preventivamente, a IA oferece ao RH a base necessária para transformar números em ações concretas, que atendem tanto às necessidades dos colaboradores quanto às demandas da organização, como a própria inovação. Desde ajustes em planos de desenvolvimento até iniciativas para melhorar o clima, a tecnologia – quando bem aplicada à gestão de pessoas – se torna uma aliada poderosa do RH, capaz de converter desafios em oportunidades. Com ela, é possível aumentar a produtividade, reduzir o turnover, identificar o nível de engajamento e possíveis gaps de competências. “Com base nisso, dá para recomendar treinamentos personalizados ou até readequações de times, maximizando o potencial individual e coletivo”, complementa Felipe.

IA, dados e inovação

De fato, não faz muito tempo que o RH se via mergulhado em relatórios extensos, tentando extrair – quase manualmente – insights que pudessem guiar decisões importantes. Embora necessário, esse processo era demorado e, muitas vezes, deixava lacunas pelo caminho. Hoje, com o avanço da inteligência artificial, mapear a realidade organizacional ficou mais rápido e assertivo, garantindo mais tempo à análise qualitativa e à ação propriamente dita.

Para Disneu Santiago, head de Recursos Humanos da HCLTech, essa mudança de mindset trouxe mais proatividade ao setor. “Por meio de pesquisas de satisfação e análise de sentimentos, conseguimos identificar colaboradores com baixo engajamento ou propensos a deixar a organização. E isso nos dá tempo para agir antes que o problema afete a equipe”, explica. Em outras palavras, em vez de simplesmente reagir a um problema, o RH passou a atuar de forma preventiva, utilizando a análise de feedbacks e tendências comportamentais para resolvê-lo antes que impacte a organização.

Além de poupar tempo ao assumir tarefas repetitivas, a IA confere ao RH uma maior capacidade de atuação. Ela ajuda a identificar “moods” e avaliar, por exemplo, o nível de satisfação dos colaboradores com relação a temas diversos, como remuneração, lideranças ou cultura organizacional. “A IA também fornece ferramentas para análise de produtividade, permitindo identificar gaps e áreas que precisam de maior investimento”, destaca Disneu. Não por acaso, munido de tecnologias como a IA, o RH consegue compreender melhor a realidade da organização e se concentrar no que realmente agrega valor ao negócio, como a inovação.

IA e inovação
Disneu Santiago, da HCLTech

Integração com o dia a dia

Mas essa atuação estratégica não surge do nada. Para que essas soluções funcionem no dia a dia e fortaleçam a cultura de inovação, é crucial que a IA faça parte da rotina dos colaboradores. Felipe Corrêa, que também é professor da FIAP, ESPM e PUC-RS, destaca como essa integração pode acontecer de forma prática. “Sistemas como Slack ou Teams podem enviar perguntas curtas e regulares, como ‘Como está seu dia hoje?’. A partir dessas respostas, a IA identifica padrões e alerta o RH sobre possíveis sinais de desengajamento”, explica. Com isso, a equipe ganha tempo para dialogar com o colaborador e tomar as ações necessárias.

Sem empatia, o processo todo corre o risco de virar um simples “ajuntamento” dados, que pouco refletem a realidade. “A IA vai te responder sempre, mas as respostas não vão te servir. E por quê? Porque ela não conhece sua empresa e colaboradores”, alerta. Por isso, ele é enfático quando diz que “a IA deve ser um ponto de partida, nunca uma sentença”. Ele dá o seguinte exemplo: “se a análise identifica um colaborador pouco engajado, cabe ao RH investigar o contexto, considerando possíveis desafios pessoais ou profissionais, antes de tomar qualquer decisão”. Com o devido contexto, os dados coletados se transformam em um fonte riquíssima de insights, fazendo da IA uma aliada do RH para a tomada de decisões mais humanas – e que fomentam a inovação por colocar o bem-estar no centro das estratégias.

Complementando a reflexão, Disneu Santiago, head de RH da HCLTech, destaca que não adianta falar de IA e inovação sem criar um ambiente onde a criatividade possa realmente prosperar. Para ele, por mais que a tecnologia impulsione a inovação, ela não sairá do papel se os colaboradores não se sentirem seguros para experimentar, errar, ajustar e tentar de novo – o que, no fim das contas, é o princípio mais básico desse processo. “A soma das culturas de feedback e segurança psicológica potencializa um ambiente propenso à inovação”, afirma.

Confiança e privacidade

Provavelmente, se a inteligência artificial fosse uma pessoa, você a acharia um tanto “bisbilhoteira”. Mas como construir confiança e garantir que os colaboradores se sintam seguros com a coleta e o uso de dados? Para Disneu, a privacidade é, com certeza, um dos maiores desafios a serem superados. “Eles podem se sentir ‘invadidos’ ao compartilhar informações com máquinas, o que nos leva a uma resistência ao uso da tecnologia. E isso não é novidade, afinal, tudo o que é novo pode gerar insegurança”, pondera o head de RH da HCLTech.

Quando transparência e ética são a base dessa relação, a inteligência artificial deixa de ser um “bicho de sete cabeças” e se torna algo mais próximo de uma “Rosie” para o RH – capaz de mapear gaps organizacionais enquanto os humanos focam na inovação, guiados por insights estratégicos. Para Disneu Santiago, a confiança começa com a clareza sobre o propósito da coleta desses dados. “Os modelos de IA devem explicar como chegaram à análise. Assim, conseguimos identificar se o modelo foi enviesado de alguma forma. E, por meio do feedback dos colaboradores, também conseguimos corrigir decisões tomadas por algoritmos que não estejam alinhadas aos nossos valores.”

Para o porta-voz da HCLTech, três fatores são indispensáveis nesse processo: cultura de feedback, transparência e comunicação. Essa tríade, quando aplicada à gestão de pessoas, não só fortalece a confiança dos colaboradores (inclusive em relação à IA), mas também desperta em cada um deles uma mentalidade de inovação, conectada aos desafios organizacionais. “Quando somamos esses três pilares, conseguimos demonstrar para a organização o ‘nosso porquê’ e de onde vêm nossas decisões”, crava Disneu.

IA e inovação
Foto: imagem gerada por IA – DALL·E

A ética como guia

Na gestão de pessoas, alinhar a tecnologia aos valores e à cultura da empresa é o que diferencia uma aplicação estratégica de uma abordagem fria e impessoal. Mais do que transformar dados em números, a IA deve ser usada com propósito – afinal, inovação não é apenas sobre avanços tecnológicos e resultados, mas sobre como eles podem promover o bem-estar. Felipe Corrêa, consultor em Gestão de Projetos e Inteligência Artificial, reforça que o equilíbrio entre transparência sensibilidade é indispensável nesse contexto. “Para garantir que as análises sejam interpretadas de forma ética e sensível, o RH deve adotar práticas que combinem a objetividade dos dados com a sensibilidade humana”, pontua.

Isso significa deixar claro como os dados serão utilizados e assegurar que o objetivo seja melhorar o ambiente de trabalho, e não vigiar ou penalizar, sempre respeitando a privacidade dos envolvidos. Felipe explica que os dados precisam ser tratados de forma anônima e agregada, protegendo a identidade individual. Imagine uma análise que aponta baixa satisfação em uma equipe, e o RH decide expor indivíduos específicos. O resultado seria desastroso. “A ideia dos dados é apontar uma oportunidade de melhoria e agir no problema”, destaca.

Além disso, ele ressalta que, embora a IA seja muito eficiente, ela não opera sozinha. A validação humana é indispensável para dar contexto. “Se a IA detecta alta rotatividade em um departamento, é fundamental conversar com gestores e equipes para verificar as causas, como problemas de liderança ou condições de trabalho que o algoritmo, por si só, não consegue capturar”, esclarece. Como Felipe bem coloca, a IA não é como um oráculo “que tudo sabe e tudo vê”, com todas as respostas. O olhar humano é o que garante sua eficácia. “Não é para terceirizar tudo. A IA traz uma análise dos dados, mas o que fazer com isso, depende da gente.”

*por Priscila Perez

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